domingo, 13 de maio de 2012

Maria Rattazzi, São uns gatunos!


Em 1879, há portanto 133 anos, a editora Dgorcet-Cadot de Paris publicou um livro da autoria da Princesse Ratazzi com o título Le Portugal à vol d’oiseau e o subtítulo Portugais et Portugaises. Maria Rattazzi, cujo nome de família era Maria Letizia Studolmire Wyse nasceu na Irlanda e era sobrinha-neta de Napoleão. Durante algum tempo adoptou o apelido do segundo marido, Urbano Rattazzi. Esteve em Portugal em 1876 e em 1879, onde conviveu com muitas figuras da política e da cultura. Logo em 1881 foi o seu texto publicado em Portugal, com o título Portugal de Relance, mas ainda em 1880, Antero se referiu ao texto publicado em França, em carta para João Lobo de Moura: “A Rattazzi, que passou dois Invernos a desfrutar os literatos de Lisboa, publicou agora um livro sobre Portugal, delicioso. Imagine uma parisiense descrevendo ao vivo, estes mirmidões. Não se fala noutra coisa e está tudo furioso”.
Trata-se de um magnífico retrato de Portugal e, em especial, da Lisboa deste tempo. Destacamos do texto alguns parágrafos sobre a análise de aspectos económicos, que parece não terem perdido actualidade:

“Há em Lisboa uma Bolsa. (…)
A Bolsa está situada na Praça do Comércio, numa das extremidades, à beira do Tejo. Se o que perdeu a fortuna tiver desejos de se deitar a afogar, não precisa ir longe. (…)
Da Bolsa aos bancos, o caminho não é longo. Porque, se os bancos não fazem parte da mesma família de negócios clandestinos ou públicos, têm pelo menos suas afinidades. É talvez por este parentesco que há tão grande quantidade de bancos em Portugal. (…)
Poder-se-ia crer que o comércio de Lisboa e de Portugal, aproveitando-se de tantos bancos, encontraria neles um pouco de crédito. Profundo erro! Os negócios, em lugar de prosperar, vão de mal a pior, especialmente para o pequeno comércio.
Por fim do ano de 1878, e por espírito de imitação, o Banco Ultramarino expiou, como o Banco de Bruxelas, as leviandades de uma péssima administração e o abuso de um guarda-livros, de um exército de empregados e de directores que meteram a mão nas algibeiras… dos outros, postas sob a sua salvaguarda. No dia imediato ao do desastre, o tesouro público punha à disposição do Banco Ultramarino a soma de dois milhões de francos, o dobro do desvio de fundos. Aqui temos guarda-livros, tesoureiros, empregados e directores que vão ao banco dos réus responder perante a justiça – se a justiça intervier no caso – por factos que lhes imputam, e o governo corre em auxílio do cofre despojado! Porquê?... Por que razão?... Como é que os dinheiros do Estado têm que ver com uma sociedade constituída por accionistas, de entre os quais alguns grandes e minúsculos empregados são uns gatunos? E com que direito aqueles que administram os dinheiros públicos, aos quais as Cortes consignaram destino especial, podem aplicá-los em socorrer um banco em falência?... Questões importantes em toda a parte, mas que seriam aqui impertinentes”.

Nota: A editora Antígona publicou, em 2004, uma 2ª edição do texto de Maria Rattazzi.

1 comentário:

  1. António Pedroso de Lima20 de maio de 2012 às 15:25

    Este post deu-me oportunidade de conhecer o livro referido que se encontra na Net (entrada no google Arquivo Digital 7cv: Portugal de relance [por] Maria Rattazzi ...). Trata-se de um relato polémico da vida em Portugal no início do período de Bon de Sousa como Diretor do Serviço Telegráfico Militar.

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