sábado, 21 de janeiro de 2012
Luís Augusto Palmeirim, O Político
Luís Augusto Palmeirim publicou, em 1879, há portanto 133 anos, uma colectânea de textos seus, recolhidos de jornais e revistas da época. O autor foi publicista, crítico de música e teatro, e também deputado. Era filho do general Luís Augusto Xavier Palmeirim e foi aluno do Colégio Militar. Uma das crónicas recolhidas tem o título de “O Político”, e são dela os seguintes trechos:
“Quando um homem qualquer não tem que fazer, e receia por um resto de pudor passar por vadio, mete-se a político.
Ser político, em Portugal, significa falar no orçamento e não o ler; na Carta Constitucional, e não saber onde ela se vende; no poder executivo, e confundi-lo com todos os outros poderes, menos com o próprio poder executivo.
Para se ser político, precisa-se: primeiro, audácia; segundo, ignorância; terceiro, ociosidade. Com estes três predicados, a leitura de alguma folha periódica, e o conhecimento pessoal de dois ou três homens que já fossem ministros, está o político feito.
O político é geralmente um homem enfastiado e fastidioso, a quem correm mal os negócios públicos e pior ainda os domésticos. O primo de outro primo que já foi pretendente e não obteve lugar que pretendia, é político: é político o mandrião que precisa de um arranjo para se casar; é finalmente político o empregado que duplicou os recibos dos seus vencimentos; o lojista em vésperas de falência; o artista sem fregueses, o operário que não chega nunca à hora de ponto.
A primeira cor da bandeira do político é liberdade. Outras, conforme os tempos, crismam-se de - progresso - melhoramentos materiais - economias e moralidade. (…)
O político interessa-se geralmente por tudo quanto é novidade, porque a novidade traz de ordinário consigo a confusão, e a confusão dá azo a deixá-lo pôr em prática as suas teorias sociais.
Escritor por absurdo, o político de profissão engendra laboriosamente períodos que a mulher expurga em casa dos erros mais crassos de ortografia, e o revisor do jornal que lhos aceita obriga-os quanto pode a fazer as pazes com a sintaxe de concordância.
Geralmente o político passa os sete melhores anos da sua vida a servir o pai da Raquel dos seus sonhos, o ministro que lhe prometeu empregá-lo na alfândega, e mais sete anos ainda antes de apanhar o lugar. Depois de servido, as crenças do político amortecem sucessivamente. Duvida do futuro da pátria, da honestidade dos seus governantes, da solvabilidade da dívida pública, da conservação das nossas colónias, duvida finalmente de tudo, menos da própria infalibilidade. (…)
O político endurecido nos vícios da sua profissão tem de ordinário uma roda de papalvos que o ouvem com respeito, e aplaudem com entusiasmo. É ele que nas ocasiões de crise improvisa a lista dos novos ministros, é ele que sem procuração redige em nome do povo as representações ao governo, é ele finalmente que no dia das eleições medita, escreve e afixa o pasquim que morde no crédito do candidato da parcialidade oposta.
Desde que o meeting, importação inglesa, se naturalizou entre nós, o político fez-se também orador. Nos comícios fala como geralmente se diz pelos cotovelos, mas deixa sempre de remissa as ideias para ocasião mais oportuna.
Quando o político chega ao termo da sua laboriosa carreira, o necrológio lança mão dele, guinda-lhe o palanfrório à altura de eloquência, e saúda na inutilidade provada a isenção catónica do finado”.
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Ah isto já dura há mais de 100 anos! Então, se calhar, escusamos de ter esperança mas também escusamos de nos preocupar tanto... :D
ResponderEliminarBjs