domingo, 4 de dezembro de 2011

Machado Santos, Aderentes e Adesivos...


No dia 4 de Dezembro de 1910, faz hoje 101 anos, Machado Santos, o herói da Rotunda, o único dos oficiais revolucionários que não fugiu ao seu compromisso na manhã de 5 de Outubro (e que viria a ser assassinado na Noite Sangrenta de 19 de Outubro de 1921), escreveu, no seu jornal O Intransigente, o seguinte texto sobre os adesivos da República:

“Nenhuma animosidade nos move, ao escrever este artigo, contra os elementos monárquicos que aderiram à República; uns por sinceridade outros por cálculo encontram-se hoje integrados no Partido Republicano, julgando-se todos com direito de fruírem as benesses do poder. Contra esse direito que julgam ter; contra a sua invasão nos diferentes cargos da República, é que redigimos este artigo, na esperança de que o Governo Provisório o tome na consideração devida para que o esforço popular se não venha a perder com a mansa e perseverante invasão que todos os dias estamos vendo.
Dos homens públicos do antigo regime, dos que estavam em evidência política, não sabemos se algum pode, com decência, enfileirar ao lado daqueles que há tantos anos lhes apontavam os erros e que, no conceito do vulgo, os vinham deprimindo.
Julgamos que não. Não há um único que perante um tribunal, pouco severo, se pudesse justificar de não haver concorrido para a ruína do seu país. Em comícios e conferências públicas, todos à uma eram acusados pelos actuais membros do Governo, e por outros ilustres caudilhos da democracia, de haverem levado este país ao cúmulo da miséria e, pior do que a miséria à morte, à desonra!
Consentir que os republicanos sinceros sejam esmagados por esses bandos de abutres, que vêm para a República trazendo em suas malas todos os vícios de oitenta anos de constitucionalismo, com suas manhas atávicas duma educação jesuítica de séculos, seria mais do que imbecilidade - seria um crime!
Não há português amigo da sua pátria, republicano ou indiferente à política, que não sinta em si um ímpeto de revolta quando venha a perceber a que tenderam todas estas adesões tão rápidas, quão faltas de sinceridade.

Imaginemos, isto de imaginar não faz mal a ninguém, que algum ou alguns dos membros do Governo, por um conservantismo exagerado, resolvia formar partido seu, ligando-se com elementos apenas convertidos ao novo credo político, após a vitória popular de 5 de Outubro! Isto seria o bastante para contaminar o novo organismo nacional do mesmo vírus mórbido que possuía o antecedente. Felizmente esta hipótese não se dá porque nenhum dos homens públicos actuais seria capaz de atraiçoar o mandato que do Directório recebeu, valendo-se da sua popularidade para, à sua sombra, ludibriar o Povo. Felizmente, repetimos, esta hipótese não se dá; o que se está vendo é uma invasão manhosa, lenta, à custa das bondades de coração dos nossos governantes e da generosa e altiva indiferença popular na acção revolucionária.
A princípio, tudo e todos se encolheram; agora debaixo dos hábitos da hipocrisia já se vão descobrindo as garras com que nos tentam apertar os gorgomilos.
Com a rubrica de independentes vão aparecendo à luz do dia todos os antigos jornais dos ex-partidos monárquicos. Por esse País fora campeiam as comissões municipais e paróquias pejadas de franquistas, teixeiristas, dissidentes, progressistas, etc. - tudo aderente - e diariamente nos chegam à redacção notícias desta grande... pouca-vergonha. (…)”.

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