terça-feira, 13 de dezembro de 2011

João Chagas, Um passeio em Paris


No dia 13 de Dezembro de 1914, faz hoje 97 anos, João Chagas, embaixador de Portugal em Paris, escreveu o seguinte no seu Diário:

"13 de Dezembro
Domingo. Céu nublado. Chuva. Almocei no Taverne Royale, com pouca gente, e à tarde dei uma volta pelos boulevards. Muita gente ao longo dos passeios, passando diante dos terraços dos cafés que foram restabelecidos, mas gente daquela que não saiu de Paris, - essa multidão lenta, mole, arrastada, de braço dado e levando crianças pela mão que é a multidão de Paris aos domingos. Aqui e ali soldados de todas as armas, pelo braço de mulheres, que parecem manifestar por eles uma ternura especial. A indústria dos bilhetes postais desenvolveu-se de um modo considerável. (…) Os que chamam de preferência a atenção do público são os postais satíricos em que o kaiser e os a1emães são criticados. A figura do kaiser aparece sob todas as formas - de besta do Apocalipse, de touro, de serpente, de porco, sobretudo de porco, que para os franceses é o animal desprezível. (…) O postal típico é o postal fotográfico em que um soldado ferido, que é representado por um belo e jucundo rapaz, revira os olhos para uma dama da Croix Rouge, que o socorre e que parece uma cocotte. Mas o que me atrai a atenção são as vitrines dos confeiteiros onde se exibem caixas e cestos de bombons de chocolate, nos quais leio com surpresa este dístico - Pour nos soldats. O quê! Os soldados de hoje comem bombons de chocolate! O que diria Napoleão? Talvez isso explique porque os franceses avançam tão pouco na região das trincheiras. Há porém melhor. Na vitrine dos escritórios do Daily Mail estão expostas umas caixas também destinadas aos soldados e contendo não só alguns objectos úteis, tais como um cachimbo e um pacote de tabaco, uma vela de estearina, um salpicão, etc., mas igualmente um jogo de dados, um baralho de cartas, um romance de Abel Hermant e – ó espanto! - um rolo de papel para water-closet. Tais cuidados despertam no meu espírito graves inquietações”.

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