domingo, 13 de novembro de 2011

Raul Proença, Em Defesa da Democracia


Em 1929, exactamente no dia 25 de Abril, fez portanto 82 anos, Raul Proença escreveu uma crónica na Seara Nova, que era o 7º texto de uma série sob o título geral de "Para um Evangelho duma Acção Idealista no Mundo Real" (a propósito de "la Trahison des Clercs de Julien Benda). Este 7º texto tinha a intenção geral da defesa da democracia e dele transcrevo pequenos excertos:

"Antes de mais nada, julgo ser preciso defender a Democracia de certas concepções que, autorizando-se dela, não fazem afinal mais do que perverter as suas ideais essenciais.
E começar por defini-la precisamente, não será já a melhor maneira de a defender? Assim, nada mais necessário do que definir o que é, para ela, a finalidade do Estado, porque um Estado que não conhece a sua finalidade desconhece os seus limites, e está, portanto, apto para exercer todas as formas de tirania.
Equivale isto a reconhecer que é preciso proclamar com toda a energia que nunca um verdadeiro democrata pode reconhecer ao Estado qualquer poder absoluto sobre o indivíduo. O que é o Estado para ele, efectivamente, senão um instrumento destinado a permitir ao indivíduo uma vida verdadeiramente livre e digna do homem? A democracia visa a servir o indivíduo e não a oprimi-lo. (...)
Seja, porém, como for, a primeira verdade a pôr em evidência é que é no direito individual, e não no direito do número, que reside a essência da Democracia. A Democracia é o regime que garante no máximo o direito de todos os indivíduos, o que a leva, por definição, a caracterizar-se, desde logo como igualitária. Não é para mim, nem para os do meu grupo, que eu exijo a liberdade; exijo-a, pelo contrário, para todos os homens seja qual for a sua condição, grupo ou partido. (...)
Daqui se conclui ainda que o terreno das opiniões deve ficar inteiramente livre de qualquer intervenção da vontade maioritária. Pois esta só é legítima porque a vontade unânime é impossível, porque a liberdade absoluta das vontades impediria praticamente qualquer deliberação colectiva, ao passo que a liberdade das opiniões não só não pode impossibilitar nenhum acto deliberativo, como é absolutamente necessária para que esses actos se realizem em todas as condições de seriedade e de legitimidade. Uma decisão colectiva que não foi tomada depois da mais larga e da mais livre controvérsia, é uma decisão cega, que não se rodeou de todas as condições de segurança e de objectividade.
Daqui se conclui, enfim, que o indivíduo tem o direito de se rebelar contra o número quando o número, menosprezando a autonomia das consciências, tenta violar os seus direitos essenciais".

1 comentário:

  1. Grandes textos como este (e outros que aparecem por aqui) deviam ser obrigatórios na escola :)

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