domingo, 15 de abril de 2012

Herculano, Entre o presente e o passado...


Em Maio de 1854, vai fazer 158 anos, Alexandre Herculano publicou o primeiro volume (Tomo I) da sua obra História da Origem e Estabelecimento da Inquisição em Portugal. No Prólogo, o autor situa o seu trabalho no contexto da sua própria época e da sua participação no triunfo da liberdade em Portugal. Apesar das dificuldades e dos caminhos censuráveis dos seus contemporâneos, Herculano nunca perde a perspectiva da História, na comparação com os tempos anteriores, que ele persistentemente procura trazer à memória.
A certo passo, diz o seguinte nesse Prólogo:

“Felizmente, no meio das loucuras do terror, muitas almas fortes, muitas cabeças inteligentes têm sabido conservar frio o ânimo para não abdicarem o senso comum. Nação pequena e que a Europa desconsidera ainda, pela ideia que faz dela, à vista de um passado não mui remoto, temos nesta parte dado mais de um exemplo de alta sabedoria a algumas das maiores nações. A história contemporânea há-de prová-lo. Creia-nos o país, a nós que não estamos costumados a lisonjear-lhe vaidades pueris ou preocupações insensatas e que, impassivelmente, lhe havemos dito sempre o que reputamos ser verdade. No meio das nossas misérias morais, e não são elas nem pequenas nem poucas, a minoria liberal que tem traído as suas doutrinas é por mais de um modo insignificante. (…)
Todavia, a civilização, tornando cada vez mais íntimo o trato das nações entre si, faz necessariamente actuar as ideias de umas sobre as outras, e o homem é, ordinariamente, mais propenso a contentar-se das ideias alheias do que a reflectir e a raciocinar. Em certa esfera, e até certo ponto, a reacção geral tem representantes entre nós. Cumpre combatê-la, não para convencer aqueles que sempre amaram o passado e nunca negociaram com as suas crenças, porque esses respeitamo-los; mas para fortificar na fé liberal os tíbios do próprio campo e premuni-los contra as ciladas dos trânsfugas. Este intuito não é só nosso; é de todos os homens leais, de todos os amigos sinceros de uma justa liberdade.
Levados pelas nossas propensões literárias para os estudos históricos, era, sobretudo, por esse lado que podíamos ser úteis a uma causa a que estamos ligados, rememorando um dos factos e uma das épocas mais célebres da história pátria; facto e época em que a tirania, o fanatismo, a hipocrisia e a corrupção nos aparecem na sua natural hediondez. Quando todos os dias nos lançam em rosto os desvarios das modernas revoluções, os excessos do povo irritado, os crimes de alguns fanáticos, e, se quiserem, de alguns hipócritas das novas ideias, seja-nos lícito chamar a juízo o passado, para vermos, também, aonde nos podem levar outra vez as tendências de reacção (…)”.

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